Manifesto assinado por vários professores do IFILO: "Dos fatos irrecusáveis, ou por que não podemos aceitar o governo Temer"

Nós, abaixo-assinados, professores do Instituto de Filosofia (IFILO) da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), consideramos o governo do Presidente (interino) Michel Temer ilegítimo, não apenas por ser fruto de um golpe nas instituições democráticas, mas também por representar o esforço de uma minoria da população contra a permanente construção de um Estado Democrático de Direito em nosso País. A justificativa desse novo programa, envergonhado, por ora, mas que certamente emergirá completa e escancaradamente se o impeachment for consumado, se apoia em uma lógica tecnocrática e desprovida de qualquer lastro democrático, pois nunca foi e nunca será aprovado pelas urnas, repetindo o modo autoritário de condução da economia que prevaleceu durante a Ditadura Militar. Podemos vislumbrar entre seus itens mais sórdidos: desmonte do SUS, reforma da previdência contrária aos interesses dos trabalhadores, redução dos recursos da Educação e precarização dos contratos de trabalho. No entanto, parte do programa ilegítimo e antidemocrático já vigora. Dentre tantos retrocessos anunciados e realizados pelo governo Temer na luta contra os avanços institucionais e sociais adquiridos com a promulgação da Constituição Federal de 1988, são por nós destacados os seguintes:

 


1- A falta de representatividade no governo do Presidente (interino) Michel Temer ameaça drasticamente os avanços democráticos e de participação popular alcançados pelo povo brasileiro desde a promulgação da Constituição Federal de 1988. Em um país no qual as mulheres representam 52% da população (segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE), a clara diminuição da participação feminina, em postos de destaque e mando na esfera federal, compromete a elaboração de políticas públicas para o conjunto da população brasileira. Soma-se também a este evento e suas consequências a falta de representatividade da população negra e de outras minorias, como, por exemplo, a LGBT;

 

2- A recepção de iniciativas que visam a policiar o ensino, como os projetos “Escola livre” e “Escola sem partido”, por parte de integrantes do governo do Presidente (interino) Michel Temer, compromete o livre exercício da docência e a formulação de uma educação que oriente os discentes para a reflexão. Os projetos “Escola livre” e “Escola sem partido” são um golpe contra uma formação humanística e científica dos nossos educandos. É uma maneira de rejeitar uma educação cosmopolita, pois compromete o debate democrático de ideias, de valores múltiplos, da alteridade cultural e sexual e de tendências conflitantes na sala de aula; e viola o ensino do conjunto das Ciências e da Filosofia, já que confunde deliberadamente o pensar filosoficamente, o método científico e suas descobertas com doutrinação cultural. Uma teoria científica como a Teoria da Evolução, por exemplo, não compartilha o mesmo fundamento cognoscitivo que a crença, por exemplo, no criacionismo referido por “design inteligente”;

 

3- A fusão entre o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação e o Ministério das Comunicações é um claro sinal do retrocesso na produção do conhecimento científico representado pelo governo do Presidente (interino) Michel Temer. Ao unir a formulação e a discussão de políticas públicas de sistemáticas diversas, o governo (interino) compromete a pesquisa, o desenvolvimento e a inovação no país. Consideramos que este fato, já exposto em manifesto pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC, é mais um sintoma do anticientificismo e da falta de compreensão do dia a dia dos pesquisadores do país por parte do governo Temer;

 

4- O encaminhamento de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) pelo governo do Presidente (interino) Michel Temer que estabeleça um teto para os gastos públicos é um retrocesso nas políticas sociais implementadas a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988. A tentativa de determinar que o gasto de um ano não pode ser superior ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do ano anterior levará ao desmonte da fixação dos gastos orçamentários obrigatórios por parte da União. Além dos gastos com saúde e educação, fazem parte dessa vinculação orçamentária obrigatória importantes rubricas para o desenvolvimento social do país. Estes gastos obrigatórios patrocinados pelo Estado Brasileiro, embora ainda insuficientes, são os que garantiram parte do desenvolvimento social da nossa sociedade nos últimos vinte e sete anos. Embora não defendamos o gasto irresponsável, sabemos que há soluções possíveis e melhores – porque não prejudicam direitos essenciais – para as contas públicas, como, por exemplo, a taxação das grandes fortunas e dos exorbitantes lucros bancários, a cobrança do que as empresas devem à Previdência etc.

 

Portanto, pelos argumentos expostos acima, nós, docentes abaixo-assinados do IFILO - UFU, consideramos o governo do Presidente (interino) Michel Temer ilegítimo e contrário à construção de um país efetivamente democrático, socialmente justo e – o que pareceria impossível ainda de ter de ser reivindicado – cosmopolita e civilizado no plano da educação.

 


Uberlândia, 29 de junho de 2016.

 

Alexandre Guimarães Tadeu de Soares

Amélia Cristina Silva Machado Prieto

Ana Maria Said

Anselmo Tadeu Ferreira

Carlos Gustavo Gonzalez

Diego de Souza Avendaño

Fábio Baltazar do Nascimento Junior

Fillipa Carneiro Silveira

Georgia Cristina Amitrano

Humberto Aparecido de Oliveira Guido

Jairo Dias Carvalho

João Bortolanza

José Benedito de Almeida Júnior

Leonardo Ferreira Almada

Lucas Nogueira Borges

Luciene Maria Torino

Marcos César Seneda

Maria Socorro Ramos Militão

Rafael Cordeiro Silva

Olavo Calábria Pimenta

Sertório Amorim Silva Neto

Suellen Caroline Teixeira